Isabel Cristina Silva Vargas
Pelotas / RS
Pelotas / RS
Tragédia anunciada
Manhã chuvosa de segunda- feira. Terceiro dia de chuva ininterrupta. Cada um lamentando pelo incômodo causado por tanta chuva. Na realidade, todos pensando nos transtornos pessoais. Carro enguiçado, movimento excessivo, engarrafamento no trânsito, plano de passeio desfeito em função do mau tempo. Ninguém teve ideia de olhar além do próprio umbigo.
Enquanto isso, na periferia da cidade, Julieta acabava de saber onde se encontrava seu marido. Passara todo o final de semana sozinha com os filhos no casebre no qual vivia próximo á ponte que liga o centro a um dos bairros da cidade. O casebre fica à esquerda da ponte, à margem de um canal que quando chove transborda deixando a situação ainda mais caótica.
Ao lembrar-se de sua situação, o estar sozinha significava, apenas, a ausência de um homem adulto, porque na realidade estava acompanhada dos filhos: cinco. Júnior de oito, José de sete, Laurinha de cinco, Maria de três e Sarah de poucos meses.
Sexta-feira era dia que seu marido receberia o dinheiro da semana na obra onde trabalhava de pedreiro. Isso significava que poderiam ter um alimento certo no final de semana. Viviam sempre na incerteza de ter comida certa. Ela não conseguia trabalhar nem de doméstica. Os dois maiores que poderiam olhar pelos menores para ela fazer uma faxina estavam na escola. Os demais eram pequenos e na creche não conseguira lugar. O marido ganhava pouco e em certas ocasiões o dinheiro ficava mais escasso, pois ele parava no bar antes de chegar a casa.
Acreditava que este poderia ter sido um destes finais de semana. Não retornara para casa na sexta. A chuva começou torrencial sexta à noite. Sábado choveu todo o dia. O canal já estava bem cheio. Com a chuva de domingo transbordava. Era lama por toda a volta. Difícil caminhar. Praticamente impossível sair de casa, ainda mais com cinco crianças. Só restava esperar. Foi o que fez todo o final de semana. Alimentou as crianças como foi possível. Sarah mamava no peito, os demais foi alternando com o que restava em casa e com uma sopa bem ralinha que a comadre que morava ao lado lhe ofereceu.
Passou todo o domingo aflita à espera do companheiro. Não sabia se tinha bebido demais e estava caído em algum lugar, se estava em algum hospital ou até preso, pois quando bebia demais se tornava mais valente e falador do que de costume.
Esperou a chuva cessar para tomar providências. Era o que fazia na manhã de segunda quando saiu de casa carregando Sara para ir a um telefone público e ligar para o serviço do marido. Talvez ele tivesse ficado pela obra com tanta chuva que caía desde o entardecer de sexta.
Caminhava com passos inseguros tentando achar um lugar melhor para pisar e não escorregar com a pequena no colo. De olhos baixos não notou o movimento junto ao canal no início da vila. Era carro da polícia militar, civil e mais m furgão do IML. Nada disso ela reparou ao longe, só percebeu ao se aproximar e ver vários conhecidos que pararam de conversar, de fazer conjecturas e a olhavam com ar compungido.
Viu que os homens carregavam um caixão coberto com uma lona que acabavam de colocar no furgão quando ela chegava.
Parou. Perguntou do que se tratava. Não havia percebido a situação, muito menos que a afetava ou que tivesse relação com ela. Foi o silêncio dos vizinhos, o seu ar de espanto e a resposta do funcionário do Instituto Médico Legal que a fez se dar conta da situação.
Ao fazer a pergunta foi que percebeu o quadro à sua volta. Talvez nem desejasse saber a resposta. Foi quando o homem respondeu friamente:
- Um homem afogado!
Ela sentiu as pernas tremerem. Um frio na barriga. Uma dor como se tivesse levado uma punhalada. Paralisou. Lágrimas começaram a escorrer em seu rosto. Permaneceu muda.
Não encontrou palavras nem forças para expressar qualquer reação.
http://www.camarabrasileira.com/com13-010.htm
Enquanto isso, na periferia da cidade, Julieta acabava de saber onde se encontrava seu marido. Passara todo o final de semana sozinha com os filhos no casebre no qual vivia próximo á ponte que liga o centro a um dos bairros da cidade. O casebre fica à esquerda da ponte, à margem de um canal que quando chove transborda deixando a situação ainda mais caótica.
Ao lembrar-se de sua situação, o estar sozinha significava, apenas, a ausência de um homem adulto, porque na realidade estava acompanhada dos filhos: cinco. Júnior de oito, José de sete, Laurinha de cinco, Maria de três e Sarah de poucos meses.
Sexta-feira era dia que seu marido receberia o dinheiro da semana na obra onde trabalhava de pedreiro. Isso significava que poderiam ter um alimento certo no final de semana. Viviam sempre na incerteza de ter comida certa. Ela não conseguia trabalhar nem de doméstica. Os dois maiores que poderiam olhar pelos menores para ela fazer uma faxina estavam na escola. Os demais eram pequenos e na creche não conseguira lugar. O marido ganhava pouco e em certas ocasiões o dinheiro ficava mais escasso, pois ele parava no bar antes de chegar a casa.
Acreditava que este poderia ter sido um destes finais de semana. Não retornara para casa na sexta. A chuva começou torrencial sexta à noite. Sábado choveu todo o dia. O canal já estava bem cheio. Com a chuva de domingo transbordava. Era lama por toda a volta. Difícil caminhar. Praticamente impossível sair de casa, ainda mais com cinco crianças. Só restava esperar. Foi o que fez todo o final de semana. Alimentou as crianças como foi possível. Sarah mamava no peito, os demais foi alternando com o que restava em casa e com uma sopa bem ralinha que a comadre que morava ao lado lhe ofereceu.
Passou todo o domingo aflita à espera do companheiro. Não sabia se tinha bebido demais e estava caído em algum lugar, se estava em algum hospital ou até preso, pois quando bebia demais se tornava mais valente e falador do que de costume.
Esperou a chuva cessar para tomar providências. Era o que fazia na manhã de segunda quando saiu de casa carregando Sara para ir a um telefone público e ligar para o serviço do marido. Talvez ele tivesse ficado pela obra com tanta chuva que caía desde o entardecer de sexta.
Caminhava com passos inseguros tentando achar um lugar melhor para pisar e não escorregar com a pequena no colo. De olhos baixos não notou o movimento junto ao canal no início da vila. Era carro da polícia militar, civil e mais m furgão do IML. Nada disso ela reparou ao longe, só percebeu ao se aproximar e ver vários conhecidos que pararam de conversar, de fazer conjecturas e a olhavam com ar compungido.
Viu que os homens carregavam um caixão coberto com uma lona que acabavam de colocar no furgão quando ela chegava.
Parou. Perguntou do que se tratava. Não havia percebido a situação, muito menos que a afetava ou que tivesse relação com ela. Foi o silêncio dos vizinhos, o seu ar de espanto e a resposta do funcionário do Instituto Médico Legal que a fez se dar conta da situação.
Ao fazer a pergunta foi que percebeu o quadro à sua volta. Talvez nem desejasse saber a resposta. Foi quando o homem respondeu friamente:
- Um homem afogado!
Ela sentiu as pernas tremerem. Um frio na barriga. Uma dor como se tivesse levado uma punhalada. Paralisou. Lágrimas começaram a escorrer em seu rosto. Permaneceu muda.
Não encontrou palavras nem forças para expressar qualquer reação.
http://www.camarabrasileira.com/com13-010.htm